Thorstein Veblen
Teoria da Classe Ociosa
Cap. II
Anteriormente à vida predatória, a proeza de um homem era tida como do grupo, e ele era apenas guardião da honra coletiva.
Quando a noção de propriedade em si, especialmente a individual – e a idéia do direito a tal –, surge no pensamento social humano, a classe ociosa se desenvolve paralelamente.
Esta divisão se deu, inicialmente, pela divisão do trabalho por sexos; a propriedade, por sua vez, se expressou de forma clara através da posse da mulher pelo homem. Esta posse foi associada a um troféu pela tomada violenta da mulher do inimigo – “casamento-propriedade”, sob chefia masculina. Essa noção de posse se estendeu à escravidão de modo geral e, mais tarde, a objetos, produtos de sua indústria – o sistema de propriedade sobre bens.
Uma vez instalado este sistema, começa a luta entre homens pela posse de bens, que vai além da necessidade de subsistência. Ao mesmo tempo, a indústria evolui de maneira cada vez mais eficiente, o que faz com que a comunidade crie um excedente de riquezas. Desse modo, a competição se agrava e é almejado o aumento de conforto individual. Além disso, há o componente coletivo na motivação para a aquisição de riqueza: busca-se a honra da posse propriamente dita, que destaca superiormente o dono do resto da comunidade – desenvolve-se a comparação odiosa dentro do grupo.
A propriedade, por conseguinte, se torna prova de sucesso pessoal. Através da busca por essa emulação, a acumulação de bens ocupa o lugar dos troféus predatórios como índice de estima. Desde que o indivíduo seja dono dos objetos que porta, independentemente de terem sido adquiridos por mérito próprio ou herança – esta última sugere ainda mais status pelo fato de obter riqueza sem esforço –, ele é digno de honra se estes se sobrepõem às posses dos outros membros. Ele receberá respeito da comunidade. Os demais, por sua vez, sentem sua auto-estima ferida ao deparar-se com uma coleção pessoal que se equipara apenas com o parâmetro do comum. Portanto, a propriedade também se torna requisito de respeito próprio, pois a auto-satisfação está intimamente relacionada com a sua estima avaliada pelo grupo, cujo critério é material.
A manifestação da força persiste no critério popular de eficiência predatória pelo hábito de pensamento. Porém, sua freqüência diminui consideravelmente, já que o conceito de posição social privilegiada está associado com a ausência ou diminuição de esforço físico.
Apesar de a aquisição material ter a capacidade de elevar o status de um sujeito, não há um padrão de suficiência preciso para tal. Ou seja, por mais que ele acumule, ele se acostumará com a riqueza e a satisfação por meio desta cessa. Desse modo, ele tende a aumentar a mesma, o que produzirá um novo critério de suficiência e novos parâmetros do normal – nova classificação pecuniária perante os outros membros. Assim, o desejo pela acumulação nunca se extingue, assim como as necessidades individuais, pois estas se baseiam no sobrepujar de um em relação aos demais.
Alcançado este nível da emulação, o poder obtido através da riqueza se torna por si só motivo para a acumulação mais intensa desta. Paralelamente, o repúdio à atividade fútil ainda revigora, e a aquisição de bens permanece a maneira mais fácil de obter estima social. Nisso, as auto-estimas dos indivíduos entram cada vez mais em colisão, fazendo com que o instinto de artesanato, de realização de ações pecuniárias, se apóie na emulação invejosa de um em relação a outros. O sucesso, portanto, se torna o fim último de todas as ações.
segunda-feira, 23 de novembro de 2009
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