Não é um medo estarrecedor, de um raio ou uma rocha flamejante atirada e cuspida em minha direção, com poder de fazer-me perecer nas chamas da destruição. É, sim, medo - tão aterrorizante quanto qualquer outro - mas de outro gênero. É medo da paz, do contentamento, da satisfação e da marola; medo de não ter pelo que morrer, somente pelo que extinguir-se.
Grande prazer me proporciona o morno lago ao fazer-me boiar, suave e perfeito; a água enrosca seus dedos por entre meus cabelos e afaga-me, com tal delicadeza e gentileza que deixo-me comover, revirar e abraçar o travesseiro de plumas e amores que as algas - tão hospitaleiras - doaram à sua fiel visitante. Enquanto a água beija meu corpo nu, contornando-o absoluto, adentrando pelas cavernas escondidas com inequiparável devoção, em minha alma floresce felicidade que a preenche até a boca, pois afinal conseguiu tudo o que desejava nas fitinhas do senhor do bonfim, tudo aquilo que confortava-a e procurava confortá-la incessantemente. Ao dar-me conta de que a fantasia tomara tal forma, ao deparar-me com ela a poucos metros de mim, aquele veneno, a amarga e temida angústia, renasce de minhas entranhas; percorre então os longos e íleos caminhos que compõem o meu cerne à procura de oxigênio, arrastando-se sempre para frente, deveras frenético e de avassaladora pressão - pois a morte por asfixia é dura demais. Segue os vestígios de luz e encontra uma válvula de escape: são meus olhos, e através deles agora vazam cachoeiras de angústia; lavando-me o corpo com o ácido líquido da culpa. Mais uma vez ardo, mas ardo não de paixão, e sim de auto-consciência; a dolorosa pontada touché por mim mesma, fincada como penitência por não saber amar como um bom burguês.
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